segunda-feira, 15 de agosto de 2011
A guerra da Somália - o caos.
Foto e texto do jornalista Rodrigo Hernández, publicado a 14 agosto 2011 no diário mexicano La Jornada com o título – A guerra, “um negócio” na Somália.
Mogadisco, 13 de Agosto.“Não quero viver agarrado a uma arma, nem que os meus filhos o façam, mas neste momento a vida não me dá outra alternativa”. Hassan Modsal tem trabalhado como mercenário nos últimos 20 anos. Viu como a sua vida laboral se deteriorava ao mesmo tempo que a das ruas desta cidade.
A Somália transformou-se no país há mais anos sem um governo central, mas a situação de crise arrasta-se há várias décadas. O fim da colonização inglesa e italiana trouxe consigo a criação de fronteiras artificiais e a imposição de um modelo de Estado que rapidamente mudou. Em 1969, Siad Barre tomou o poder através de um golpe de Estado. Centrou a sua governação nas lutas contra a Etiópia, sem conseguir uma verdadeira evolução económica no seu território.
Durante esses anos, pessoas como Hassan tentavam fazer a sua vida trabalhando no comércio informal. “ Não pude terminar a escola e pronto, comecei a trabalhar como motorista de camiões e carregando caixas no porto”. Como muitos dos seus compatriotas, aproveitava as férteis costas que banham as terras somalis para tirar proveito da pesca.
Mas, com o início da guerra civil nos princípios dos anos 90, tudo mudou para a maior parte destas pessoas. “O trabalho acabou e não tinha outra possibilidade além de procurar emprego numa milícia de segurança privada”. Nunca tinha tocado numa pistola, mas eles ensinaram-me”. A parte mais dura da batalha desenrolou-se na capital. Mogadisco ficou dividida, os seus edifícios destroçados e a maior parte do asfalto desapareceu.
Inclusivamente as principais organizações internacionais saíram do território somali, perante a dureza dos confrontos. “Eu nunca quis lutar ao lado das tropas do exército. Para mim estar com eles era participar numa guerra com a qual não estava de acordo”, comenta Hassan, que acompanhado por outra dezena de homens armados, escolta personalidades de outros países, em vez de fazer parte de algum dos exércitos no terreno.
Os Estados Unidos realizaram incursões infrutíferas no território somali. Em 2000 estabeleceu-se um governo de transição sem o apoio da maioria dos clãs, embora apoiado por soldados do Uganda e do Burundi, que compunham a Missão da União Africana na Somália (Amison).
A grande quantidade de frentes de combate abertas, as dificuldades com o idioma e a incapacidade de delinear estratégias comuns com o exército nacional, levou a que em nenhum momento o país tenha estado sob controlo.
A instabilidade sente-se igualmente no bolso da maioria. A seca demonstrou a falta de infra-estruturas num país onde milhões de pessoas continuam a viver de uma agricultura rudimentar, e a escassez de trabalho atinge também as cidades.
Hassan, por exemplo cobra pouco menos de 150 dólares mensais; o seu desejo, disse, seria abrir um negócio, mas “apenas tenho para dar de comer à minha família”. Já ouve ocasiões em que tive de vender a própria arma para conseguir comida”.
A maior parte do armamento que circula na Somália consegue-se no mercado negro. Nas ruas de Bakara Market há um constante girar de traficantes, soldados e milicianos. “A maior parte do material bélico que compramos provém da Amison. Qualquer um pode levar uma AK-47 por uns 300 dólares, ou um morteiro anti-aéreo por cerca de 10 mil”. O problema, disse, é que os preços começaram a subir quando o nível dos confrontos subiu, sobretudo quando aumentaram os sequestros realizados pelos piratas na costa.
O porto onde Hassan trabalhou está actualmente em ruínas, mas não só pelo efeito das bombas. Vários organismos internacionais denunciaram durante anos o uso indevido das águas somalis pelos grandes barcos estrangeiros que acabaram com a faina dos pescadores somalis. Muitos jovens afectados por essas práticas, começaram a dedicar-se a actividades ilícitas, tendo muitos deles acabado por participar nos milionários raptos de navios estrangeiros.
Aqui tudo gira em torno do dinheiro, não só no mundo da pirataria como também nas milícias”. O caso mais emblemático, segundo ele, é o de Al Shabab. “80 por cento da gente que conheço, nunca iria com eles, mas fazem-no por razões económicas. Ganham mais do dobro que numa milícia. São muito jovens, imaturos, que sempre viveram nesta situação de guerra e não alcançam a realidade do que fazem.
Este grupo extremista islâmico encontrou o seu lugar com o desmantelamento da União dos Tribunais Islâmicos. Pesaram mais as pressões internacionais numa situação de alerta anti-islamita (pouco depois do 11 de Setembro) que a estabilidade conseguida por este grupo em 2006. Desde esse momento as tensões e confrontos aumentaram. Uma apreciação das grandes potências simplifica a situação entre um grupo democrático e outro radical sem levar em conta a existência de dezenas de clãs”.
Apesar do governo somali dizer que não tem recursos suficientes, o seu ministro do Interior, Abdishamat Mohali, assegurou que tem muito soldados para conseguir levar a cabo a sua estratégia de segurança. Por isso, decretou-se o estado de emergência e os soldados têm autorização de executar qualquer suspeito com base na lei militar.
“São muito maus tempos, passaram-se muitas coisas más; creio que o mundo deveria dar os passos correctos para corrigir isto”, reflecte Hassan.
Após décadas de confrontos, pensa que é o momento de dialogar para que os somalis decidam o seu futuro.
Traduzido (por “o ClariNet") do La Jornada
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1 comentário:
PERGUNTO!ATÉ QUANDO O HOMEM PRETENDE SER TÃO IRRACIONAL HIPÓCTRA E IGNORANTE, CONSIGO MESMO?TANTA GENTE MORRENDO EM CONFRONTO, DE FOME, DOENÇAS, E UM GOVERNO TOTALMENTE FRAGILIZADO. É DE EXTREMA IMPORTÂNCIA, NÃO SÓ DO GOVERNO LOCAL, MAS, DE TODA NAÇÃO PRINCIPALMENTE DA ONU, FAZER ALGUMA COISA EM PROL DAQUELA GENTE, AFINAL SÃO TODOS SERES HUMANOS,ONDE MERECEM SER RESPALDADOS POR FORÇA DO PRINCÍPIO DA (DIGNIDADE HUMANA!).
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